As relações entre Peru e Brasil, 1826-2012
Abstract
Desde o início da República, o Peru teve consciência da importância e da dimensão do Brasil no contexto sul-americano e mundial. Prova disso são os esforços de nossas autoridades para estabelecer relações diplomáticas com esse país. Não obstante, foi somente na segunda década do século XX que se começou a fortalecer e aprofundar a relação, até que, em 2003, se conseguiu finalmente materializar a aliança estratégica com o gigante sul-americano.
Essa evolução positiva de nossas relações com o Brasil foi consequência de uma visão realista e pragmática de nossa política exterior, que internalizou os benefícios de uma associação profunda e diversificada com esse país.
O Brasil é o país mais extenso da América Latina, com 8.5 milhões de km2, representando 54,2% de todo o território da América do Sul; possui também a maior população dessa região, com mais de 192 milhões de habitantes, características que por si só o convertem em um país-continente. Do mesmo modo, tem um produto interno bruto (PIB) de mais de US$1,5 bilhão, sendo a segunda economia do continente americano (depois dos Estados Unidos) e a sexta economia do mundo, tendo superado a Grã-Bretanha a partir de 2011.1 Em termos de investimentos, as dimensões do mercado brasileiro fazem com que estejam presentes no país muitas das principais corporações transnacionais, especialmente a partir do retorno dos capitais estrangeiros nos anos 1990, depois da crise da dívida externa. Quanto ao comércio, o Brasil teve em 2010 um superávit na balança comercial de US$ 26 bilhões, sendo seus principais destinos a China (US$ 40,7 bilhões), Estados Unidos (US$ 23,3 bilhões), Argentina (US$ 20,9 bilhões), Holanda (US$ 12,7 bilhões) e Japão (US$ 8,6 bilhões).
Além disso, o Brasil se transformou em um importante ator político da cena regional e mundial. Sua liderança na região sul-americana se traduz na criação do Mercosul, da Unasul, do Conselho de Defesa Sul-Americano, do Anel Energético, entre outras iniciativas, além de sua influência política em países como Venezuela, Bolívia e Equador. O interesse brasileiro em fazer da Unasul um bloco capaz de resolver suas diferenças do mesmo modo que outros blocos regionais, além de aprofundar as relações econômico-comerciais que consolidem seu desenvolvimento, está na base desse projeto de integração. Como disse Celso Amorim: Com toda sinceridade devo afirmar que, embora o Brasil seja um país grande, é ainda pequeno em um mundo como o nosso […]. É por isso que trabalhamos juntos no Mercosul, é por isso que estimulamos a Comunidade Sul-Americana, que ajudamos a criar […].
Temos que fazer da América do Sul no século XXI o que a América do Norte fez no século XIX, com o objetivo de estabelecer a integração física de nossa região, de nosso continente. Como os Estados Unidos da América, a América do Sul deve ser capaz de negociar com o mundo.
Por outro lado, o Brasil é percebido pelos Estados Unidos como um país líder, estável e estabilizador da América do Sul que, além disso, mantém uma excelente relação com o mundo europeu, a África, o Golfo Pérsico e a Ásia Central, convertendo-se “em peça-chave na articulação de nossa região com os países africanos (ASA) e com os países árabes (ASPA). É o único país da região que tem embaixadas em praticamente todos os países africanos e uma presença ativa permanente nos principais países asiáticos”. Como se não bastasse, é um ator importante no G20 e aspira a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Além disso, o Brasil conta com as forças armadas mais numerosas, mais bem equipadas e mais desenvolvidas tecnologicamente da América do Sul, e com uma sólida indústria de armamento altamente competitiva com os mercados internacionais.
A tudo isso devemos acrescentar que é o vizinho com o qual compartilhamos nossa fronteira mais extensa (2.822.500 km), com que formamos o espaço amazônico mais extenso e com o qual ocupamos estrategicamente o centro do espaço sul-americano, com possibilidade de acesso aos oceanos Atlântico e Pacífico. Precisamente, o Brasil começou a ver com maior atenção este último espaço marítimo, sobretudo a partir da crise financeira internacional e desde o momento em que a China se converteu no primeiro mercado de importação e exportação de produtos brasileiros. Isso torna o Peru ainda mais atraente, não só por ser fronteiriço e por ter um conjunto de redes viárias de integração física com o Brasil, mas também porque o Peru se inseriu econômica e institucionalmente na Bacia do Pacífico. Assim, o Peru não só faz parte da APEC, como celebrou tratados de livre comércio com China, Estados Unidos, Canadá, México, Chile, Singapura e Coreia do Sul, além de Japão e Tailândia. Ademais, o Peru apresenta claras vantagens em comparação com seus vizinhos na saída para o Pacífico. Seus portos se encontram mais próximos do território brasileiro do que os de outros países vizinhos. Em especial, Ilo e Matarani estão mais próximos da zona de maior dinamismo amazônico do Brasil e seus corredores interoceânicos têm a vantagem sobre os de Chile e Equador de não exigirem a travessia de territórios de outros países para chegar ao Pacífico. Por outro lado, deve-se levar em consideração que, durante o período 2002–2008, a participação da Ásia no intercâmbio comercial mundial do Brasil aumentou de 16,52% (17,794 bilhões de dólares) para 22,82% (84,701 bilhões), desbancando em 2008 os Estados Unidos, com 14,3% (53,051 bilhões) e até a União Europeia, cuja participação foi de 22,24% (82,573 bilhões).
Por tudo isso, uma pesquisa sobre a evolução e projeção das relações diplomáticas entre Peru e Brasil é particularmente importante, tanto para compreender o estado atual da relação, como para identificar as ações que devem ser efetuadas no futuro para seu fortalecimento e consolidação, o que não somente redundará em benefício para as populações de ambos os países, como também para a integração sul-americana.
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